Sumário executivo

Como pode Portugal maximizar os benefícios do seu sistema de cooperação para o desenvolvimento «descentralizado? Esta questão esteve no cerne do exame pelos pares do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD) da OCDE de 2022, realizado pela Alemanha e pela Hungria. Vários ministérios e instituições-chave estão fortemente envolvidas na cooperação para o desenvolvimento de Portugal, sendo o Camões, I.P. a entidade nacional que orienta e coordena todos os esforços. Cada instituição aporta conhecimentos especializados, recursos e parcerias de longa data com instituições congéneres nos países parceiros. Ao mesmo tempo, a riqueza e a diversidade dos atores envolvidos representa um desafio para a agregação de todos estes esforços. Num contexto de apoio político consistente e de melhoria das perspetivas económicas, o exame pelos pares avaliou as mudanças necessárias que permitiriam a Portugal potenciar as capacidades da sua rede institucional e simultaneamente mitigar os desafios em curso. Em termos de medidas-chave, Portugal deverá reforçar a capacidade de implementação e coordenação através do aumento da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) e da delegação de competências para o terreno. Todos os atores deverão prosseguir uma mudança sistémica e sustentável nos países parceiros, através de objetivos comuns e de um maior enfoque nos resultados.

O quadro institucional, bem estabelecido, poderia beneficiar de uma coordenação mais estratégica, de uma desconcentração de competências e de investimento nos recursos humanos. Todos os atores reconhecem o papel de liderança do Camões I.P., e a coordenação regular permite a partilha de informação e a identificação de sinergias no trabalho quotidiano. A criação de Centros Portugueses de Cooperação foi um passo importante no sentido de uma tomada de decisão mais localizada, complementando os esforços para aumentar as capacidades e as competências na sede e nos países parceiros. De forma a conduzir todos estes esforços para objetivos comuns, Portugal poderia estabelecer orientações estratégicas interministeriais para as suas prioridades e convocar regularmente os atores da cooperação tendo em vista um planeamento conjunto a médio/longo prazo. Responder aos principais constrangimentos em matéria de recursos humanos, em particular a elevada rotatividade e a insuficiente experiência de novos colaboradores em matéria de desenvolvimento, será fundamental e deverá ser planeado a nível interministerial. Portugal deve prosseguir os seus planos para delegar competências e recursos nos Centros de Cooperação, uma vez que tal aumentaria a eficiência e reforçaria a sua capacidade de implementação.

Portugal poderia fazer mais para explorar oportunidades de aprendizagem em todo o sistema. Portugal utiliza a monitorização e as avaliações para desenhar, ajustar e rever as suas intervenções e está a tirar cada vez mais partido dos conhecimentos de atores não-governamentais. Para fortalecer a cultura de aprendizagem em todos os ministérios, Portugal poderia tornar acessíveis as novas ferramentas de gestão do conhecimento e aprendizagem do Camões I.P. e considerar implementar uma política de avaliação conjunta e reporte de resultados comuns. Centrar as avaliações em questões com benefícios mais vastos em termos de aprendizagem poderia incentivar ainda mais o envolvimento e o acompanhamento interministeriais dos resultados da avaliação. A definição sistemática dos efeitos esperados, além dos resultados (mais) imediatos, produziria benefícios significativos para a eficácia da cooperação de Portugal. Com base em experiências positivas, Portugal poderia criar mais oportunidades de diálogo estratégico com os diversos atores, incluindo com a sociedade civil.

Portugal acrescenta valor através do seu estreito relacionamento com a União Europeia. Prosseguir a sua agenda de reformas internas será importante para garantir todos os benefícios da cooperação delegada. O relacionamento com a União Europeia (UE) é uma das principais prioridades para Portugal, tanto em termos de políticas como de implementação. A sua recente Presidência do Conselho da UE ajudou a promover visões convergentes sobre questões desafiantes. Elevados montantes de cooperação delegada aumentam a presença de Portugal nos países parceiros, ao mesmo tempo que impulsionam os esforços de reforma interna e tornam a cooperação para o desenvolvimento politicamente visível. A programação no âmbito do novo orçamento da UE oferece a Portugal oportunidades para trabalhar com base nos seus pontos fortes. No entanto, prosseguir os esforços de reforma interna será importante para fazer face aos desafios na gestão dos projetos da UE. Definir prioridades em termos da abordagem a seguir por Portugal poderia ajudar a responder às preocupações dos atores da cooperação portuguesa quanto ao equilíbrio entre cooperação com a EU e cooperação Portuguesa.

Portugal tem fortes razões para aumentar o volume da APD, mantendo simultaneamente a qualidade da APD. A clara concentração de Portugal num conjunto limitado de países com mais necessidades constitui a base para sinergias em todo o sistema. Portugal fez progressos significativos no que respeita ao desligamento da APD. No entanto, apesar de Portugal se encontrar a recuperar da crise financeira, o seu volume de APD ainda não alcançou o desempenho passado, nem o dos seus pares do CAD. Um aumento dos recursos poderia reforçar a capacidade interna e permitir a colaboração programática em todos os ministérios. Para aumentar a APD, Portugal terá de investir na sensibilização de determinados atores, num esforço de comunicação interministerial e em instrumentos para planear o futuro e permitir o debate. Portugal deve assegurar que a promoção do setor privado português nos países parceiros esteja alinhada com o seu objetivo de criar impacto no desenvolvimento.

As relações estreitas de Portugal com os países parceiros e o seu respeito pela apropriação destes países constituem uma mais-valia da sua cooperação bilateral, que poderia beneficiar ainda mais da mobilização dos diversos esforços. Portugal e os seus parceiros prioritários valorizam as suas estreitas relações bilaterais, que assentam em laços históricos e linguísticos. As instituições públicas portuguesas estão empenhadas nestas parcerias e mobilizam toda a sua experiência e conhecimento, bem como os conhecimentos da sociedade portuguesa. Ao fazê-lo, são sensíveis à apropriação nacional e respondem aos pedidos dos parceiros. Os laços estreitos com os países parceiros estão também na base da sensibilização internacional bem sucedida por parte de Portugal em prol da cooperação triangular. Um maior enfoque nos resultados e objetivos de mais longo prazo nas suas parcerias com os países poderia ajudar a potenciar a contribuição de Portugal para uma mudança estrutural e desenvolvimento sustentável nos países parceiros. Além disso, intervenções mais programáticas poderiam reduzir o elevado grau de dispersão, aumentar a eficiência e o enfoque nos resultados, preservando simultaneamente a sua capacidade de resposta às necessidades dos parceiros.

Portugal poderia reforçar os seus esforços ao nível do nexo humanitário-desenvolvimento-paz, através de uma maior localização e apoio à governação da componente civil do setor de segurança. Em contextos de fragilidade, Portugal mobiliza sistematicamente a experiência e o conhecimento técnico das suas instituições de justiça, segurança interna e defesa. Tendo em conta as suas relações de proximidade com os países parceiros, Portugal desempenha um papel importante na resposta a crises e facilita também a participação de outros parceiros. Os mecanismos de coordenação e de sensibilização promovem o nexo, enquanto que a diversidade de instrumentos facilita a transição da ajuda humanitária para a recuperação a médio prazo. Para reforçar a perspetiva do nexo a mais longo prazo, Portugal poderia recorrer mais à consulta local e à análise conjunta e também reforçar a capacidade de resposta local através da ajuda humanitária. Elevar o perfil da governação e reforma do setor de segurança civil seria um complemento importante das suas parcerias no setor de segurança. Tornar as modalidades de apoio à sociedade civil mais flexíveis e de mais longo prazo ajudaria a assegurar que a programação, por parte das organizações da sociedade civil, responde às solicitações locais, apoiando, desta forma, uma maior apropriação local.

As oportunidades de reforçar o apoio aos países parceiros no domínio do ambiente e das alterações climáticas beneficiarão de prioridades e capacidades mais claras. O papel de Portugal na sensibilização a nível internacional tem por base o seu bom desempenho e a sua experiência e conhecimento a nível nacional. Para continuar a liderar através do exemplo, Portugal poderia reforçar os mecanismos de coerência política em matéria de ambiente e clima a nível interno. Portugal procura reforçar o seu portfólio reduzido no domínio do ambiente e do clima. De forma a tirar o máximo potencial da experiência e conhecimento técnico e dos recursos de todo o sistema, será crucial estabelecer orientações e ferramentas e assegurar capacidades para poder acompanhar os aumentos de financiamento previstos. Investir no diálogo com os atores envolvidos poderia ajudar a tirar partido das competências e redes nacionais.

O exame pelos pares avaliou igualmente a implementação das recomendações do exame de 2016. Constatou que Portugal tomou medidas para implementar 16 das 19 recomendações do CAD e que 4 recomendações estão plenamente implementadas. Informações adicionais sobre políticas, disposições institucionais, sistemas de financiamento e de gestão de Portugal estão incluídas no retrato da Cooperação Portuguesa para o Desenvolvimento (https://www.oecd.org/officialdocuments/publicdisplaydocumentpdf/?cote=DCD/DAC/AR(2022)4/16/FINAL&docLanguage=en) e no Perfil de Cooperação Portuguesa para o Desenvolvimento. Na plataforma de aprendizagem Development Co-operation TIPs - Tools Insights Practices [Cooperação para o Desenvolvimento - Ferramentas, Conhecimentos e Práticas] (https://www.oecd.org/development-cooperation-learning) estão descritas as áreas de boas práticas que podem inspirar outros membros do CAD e atores de desenvolvimento.

As seguintes recomendações visam apoiar Portugal no reforço dos pontos fortes da sua cooperação para o desenvolvimento, na resposta aos desafios que subsistem e na prossecução dos esforços de reforma em curso:

  1. 1 Para alcançar maiores sinergias no sistema de cooperação para o desenvolvimento, Portugal deve promover a tomada de decisões estratégicas conjuntas e, com base no papel de liderança do Camões I.P., desenvolver um trabalho conjunto entre os ministérios para coordenar a programação, a orçamentação, a conceção de linhas de orientações e o acompanhamento do processo de monitorização e avaliação.

  2. 2 Para aumentar a eficiência, racionalizar processos e reforçar a capacidade de intervenção local, Portugal deve continuar a delegar competências ao nível da programação e execução nos Centros de Cooperação, garantindo que estes têm capacidade para cumprir as suas responsabilidades adicionais.

  3. 3 A fim de reforçar as suas capacidades de coordenação estratégica, de garantia de qualidade e de implementação, Portugal deverá avaliar e planear os recursos humanos da cooperação para o desenvolvimento em todos os ministérios, continuar a investir na formação, fazer face à elevada rotação dos seus colaboradores e usar de forma flexível e eficaz a experiência e conhecimento técnico, no Camões I.P., nos ministérios competentes e através de processos de recrutamento externos.

  4. 4 Para reforçar o valor da monitorização e da avaliação, Portugal deve integrar sistematicamente os resultados esperados na conceção de projetos e programas por país, na monitorização e reporte dos progressos realizados; planear, colaborar e fazer seguimento das avaliações de forma conjunta com todos os ministérios; discutir e partilhar amplamente conhecimentos adquiridos; e assegurar a afetação de recursos suficientes à gestão baseada nos resultados e à avaliação independente.

  5. 5 Para cumprir os seus compromissos e ambição em matéria de APD, Portugal deve adotar uma abordagem que englobe todos os ministérios, a fim de:

    • Estabelecer um roteiro com metas acordadas a nível nacional, e com prazos definidos, para aumentar progressivamente a APD.

    • Definir prioridades interministeriais para a forma como e onde serão aplicados os aumentos da APD e garantir a existência de capacidades para gerir recursos adicionais.

    • Empreender esforços coordenados de comunicação e de envolvimento para transmitir o valor acrescentado e a razão de ser da cooperação portuguesa para o desenvolvimento.

  6. 6 Tendo em vista maximizar o envolvimento do seu setor privado, Portugal deverá avaliar de que forma poderão os seus instrumentos de apoio ao setor privado melhor contribuir para o desenvolvimento sustentável nos países parceiros e aumentar a cooperação com parceiros internacionais, incluindo instituições de financiamento do desenvolvimento. Portugal deve também assegurar que os seus esforços de internacionalização da economia portuguesa contribuem para o impacto no desenvolvimento e não prejudicam os progressos no desligamento da sua APD.

  7. 7 Para reforçar o seu enfoque em alterações sistémicas e sustentáveis e aumentar a eficiência e a eficácia da sua cooperação bilateral, Portugal deve adotar uma abordagem mais programática que agregue as suas diversas intervenções e acordar com os países parceiros um conjunto de resultados prioritários para os quais as atividades de Portugal contribuam coletivamente.

  8. 8 A fim de assegurar que os esforços de promoção da paz, desenvolvidos por Portugal no âmbito da abordagem do nexo, contribuem para a estabilidade a longo prazo e para o desenvolvimento sustentável, o país deverá reforçar o seu apoio à governação do setor de segurança, integrando ainda mais os elementos de supervisão civil e de reforma do setor de segurança nas suas atividades de cooperação militar.

  9. 9 Para maximizar o contributo da sociedade civil no âmbito dos seus esforços de cooperação para o desenvolvimento, tanto na sede como nos países parceiros, Portugal deverá – em discussão com os parceiros da sociedade civil – disponibilizar financiamento mais flexível e a mais longo prazo e recorrer de forma mais sistemática e estratégica à experiência e conhecimentos da sociedade civil, tanto em Portugal como nos países parceiros.

  10. 10 A fim de reforçar a sua contribuição para os objetivos ambientais e climáticos, Portugal deverá definir um conjunto de prioridades de cooperação interministerial em matéria de ação ambiental e climática com base nas suas competências nacionais, bem como aumentar as capacidades, por exemplo, através do desenvolvimento de orientações e formação do pessoal da cooperação.

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